Dilma resistiu ao autoritarismo, mas seu estilo reservado e sóbrio tem confundido até a mídia, acostumada com o vulcão Lula, que produzia fatos, muitos dos quais polêmicos, quase que diariamente, abastecendo o estoque de notícias das redações. Essa mídia ainda não acompanhou o timing da nova ocupante do Planalto. Além de ser discreta e de não gostar muito da exposição ao público, a presidente (que gosta de ser chamada de presidenta) é uma gestora tida como durona. Costuma chegar em torno das 9 horas ao Palácio e de lá só sai por volta das 22 horas, muitas vezes fazendo suas refeições no próprio gabinete.
Dilma tem um estilo sóbrio e discreto, ao contrário de Lula
Ela não tolera atraso nas reuniões. É metódica e detalhista, procura se inteirar minunciosamente de todos os assuntos de governo. E tem como ministros mais assíduos em seu gabinete: o chefe da Casa Civil, Antonio Palocci; o ministro da Economia, Guido Mantega; e o ministro da Justiça, José Eduardo Cardoso. Além de Gilberto Carvalho, que é o secretário-geral da Presidência da República e seu mais direto assessor. A presidente também não gosta da excessiva exposição pública de seus auxiliares e não tolera polêmicas públicas envolvendo questões estratégicas de governo.
Não aceita a queda de braço entre ministros através da imprensa e muito menos quebra de hierarquia. Tanto que não teve receio algum em demitir o advogado Pedro Abramovay, que assessorava a Casa Civil e estava para assumir a Secretaria Nacional de Políticas Antidrogas pelo fato deste ter defendido mudanças na legislação, envolvendo penas alternativas ao invés de prisão para os usuários de drogas.
Abramovay, que na campanha presidencial já havia causado problemas a então candidata ao ser citado em uma reportagem da revista Veja, na qual supostamente teria dito ao delegado Romeu Tuma Júnior, da Polícia Federal, que já não aguentava mais pedidos de Dilma e outros integrantes do governo para fazer dossiês contra adversários, conseguiu de manter no governo negando tais afirmações.
No entanto, foi abatido antes mesmo de assumir o novo cargo por ter defendido políticas de segurança pública e defesa social que ainda não eram consensuais no governo, e ainda por cima sem o aval da presidente e do ministro da Justiça, seus superiores imediatos.
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Outro que causou desconforto e quase perdeu o cargo foi o general José Elito Siqueira, chefe do Gabinete de Segurança Institucional (GSI). Elito teria se posicionado contra a criação da Comissão da Verdade que se instalaria para apurar violações aos direitos humanos no período do regime militar e disse a imprensa que o período da ditadura e a questão das torturas representariam apenas “um fato histórico", sobre o qual “não se deveria envergonhar ou se vangloriar”.
A declaração causou profunda irritação a presidente, uma ex-guerrilheira que foi presa e torturada pelo regime. Elito foi chamado a se explicar, e só não perdeu o cargo porque disse ter sido mal interpretado pela imprensa e porque o ministro da Defesa, Nelson Jobim, procurou colocar panos mornos no caso. Mas Dilma não perdeu a oportunidade para enquadrar o militar e também chamar a atenção do próprio ministro da Defesa, que começava a se envolver em um bate-boca com a secretária nacional de Direitos Humanos, Maria do Rosário, ao também condenar publicamente a Comissão da Verdade defendida por Rosário e por seu antecessor, Paulo Vannucchi. |
Dilma não gostou das declarações do general José Elito sobre a ditadura de 1964 Rousseff não se cansou também de reafirmar o principal compromisso de seu governo: erradicar a miséria. Ela insistiu na questão do combate a pobreza e bateu várias vezes nessa tecla na maioria de seus pronunciamentos. |
Por isso foi aplaudida por parcela significativa da intelectualidade de esquerda, que a exemplo do falecido sociólogo Herbert de Souza (o Betinho), colocou o tema como prioritário e na ordem do dia ao longo das últimas duas décadas. O economista José Pascoal Vaz, professor da UniSantos, foi um dos que não poupou elogios dizendo ser inaceitável que milhões e brasileiros ainda tenham que sobreviver com menos de um salário mínimo por mês “enquanto centenas de executivos financeiros, por exemplo, tem renda mensal que chega a superar mil salários mínimos”.
Outro economista e renomado pensador, Paul Singer (professor aposentado da USP), também apoia a proposta. Ele a considera ousada, mas perfeitamente factível. Mas nem tudo agradou. Lideranças políticas, economistas e cientistas sociais desenvolvimentistas condenaram a alta de juros sacramentada pelo Banco Central logo na primeira reunião do Comitê de Política Monetária (Copom) em 2011.
Alguns analistas econômicos consideraram essa medida precipitada, inoportuna e até “inepta”, como chegou a afirmar o jornalista e comentarista econômico Luís Nassif. Esses críticos acreditam que há outros mecanismos para se evitar o crescimento da inflação e os efeitos da crise provocada pela guerra cambial entre China e EUA, que ainda precisam ser mais bem maturados e melhor compreendidos. |
A erradicação da miséria, defendida pelo sociólogo Betinho, é a prioridade de Dilma
Por sua vez o diálogo e o canal de negociação com as centrais sindicais foram mantidos. CUT e Força Sindical se mostraram insatisfeitas com o aumento do salário mínimo para este ano.Mas o governo deixou claro que não haveria margem de manobra para aumentos superiores ao proposto e que as regras do jogo,
que garantiram reposição salarial com correção da inflação, foram estabelecidas pelas próprias centrais sindicais em negociações anteriores com o governo Lula.
Já no campo político a presidente conseguiu resistir as chantagens por cargos por parte dos partidos da base aliada, em especial o PMDB. No seu governo o PT conquistou espaços importantes, levando os estratégicos ministérios da Saúde e das Comunicações, que antes estavam nas mãos do PMDB.
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Dilma impõe autoridade nas brigas por cargo entre PT e PMDB
Isso irritou os peemedebistas e quase precipitou a primeira crise mais séria do governo. Todavia o estilo Dilma se impôs. E como bem o frisou o jornalista Luís Nassif, sem abrir mão de sua autoridade ela despachou seu primeiro recado: “o governo é de todos nós (partidos da base aliada), mas a última palavra é minha”. Com isso a presidente mostra não se intimidar com as pressões políticas.ático de fazer política. |
Mostra que quer por ordem na casa logo de cara, enfrentando as negociações políticas de varejo e o velho e execrável fisiologismo, primo irmão do não menos execrável clientelismo. Se vai conseguir resistir são outros quinhentos. O estilo prevalentemente técnico e burocrático de Dilma certamente não está agradando os que entendem que o papel de um governante deve ser eminentemente político e só secundariamente administrativo. Mas ela tem surpreendido aos que apostavam na sua falta de habilidade.
Até aqui tem sabido dosar bem o seu lado gestor e o seu lado político. Isso frustra seus opositores. Do mesmo modo que inquieta a imprensa o modo discreto e mineiramente enigma |
Dilma e a esfinge: ambas com um enigma a ser decifrado
Já há quem a chame de esfinge. Aquele ente indecifrável do antigo Egito, imortalizado nas colossais obras deixadas por essa histórica civilização.
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